Análise de Falhas: Caso RMS Titanic

Considerado um símbolo de tecnologia devido à utilização dos recursos mais avançados disponíveis em sua construção, o RMS (Royal Mail Steamer) Titanic foi referência em luxo e estrutura quando comparado aos demais navios da época. Inaugurado em 1911 pela empresa britânica de navegação White Star Line, detinha o título de maior navio de passageiros do mundo, buscando atender a demanda de viagens de luxo entre América do Norte e Europa. Sua construção teve início em 1909, em Belfast – Irlanda do Norte, sendo posteriormente enviado para Inglaterra.

Fotografia do RMS Titanic. Fonte: Inspeção de Equipamentos, 2013.

Com dimensões de 266 metros de comprimento, 28 metros de largura e 53 metros de altura (destes 42,5m acima da água), o RMS Titanic continha 16 (dezesseis) compartimentos para impedir que o casco afundasse, continuando a navegar mesmo que 4 (quatro) fossem tomadas pelas águas. Em função da confiança nos dispositivos de segurança de que o navio não afundaria, foi decidido que menos botes salva vidas seriam carregados, deixando o convés mais livre e elegantes aos passageiros.

Fotografia da construção do Titanic. Fonte: MARCOMINI; BAPTISTA, 2015.

No dia 10 de abril de 1912, o RMS Titanic partiu do porto de Southampton, na Inglaterra, com destino a à cidade de Nova York para sua viagem inaugural, com 2,2 mil pessoas a bordo.

A estrutura do RMS Titanic era composta por milhares de chapas de aço baixo carbono (%C < 0,2) com três centímetros de espessura, unidas por rebites. Na região central do navio, equivalente a ⅗ de seu comprimento, foram utilizadas três fileiras de rebites de aço baixo carbono, considerando as tensões de flexão máximas localizadas. Nas demais regiões, proa e popa, foram utilizadas duas fileiras de rebites de ferro forjado. 

Na madrugada do dia 14 de abril de 1912, o RMS Titanic se chocou com um iceberg nas águas frias do Atlântico Norte, causando uma abertura na lateral do casco do estibordo ( lado à direita do navio quando o observador olha para a frente), próximo a proa, de cerca de 91 (noventa e um) metros de comprimento e possibilitando a entrada de água nos compartimentos. Embora o navio fosse capaz de continuar a viagem com 4 (quatro) dos seus 16 (dezesseis) compartimentos comprometidos, 6 (seis) compartimentos foram expostos à água do mar, sendo o seu naufrágio inevitável a partir daquele momento. 

Com a proa completamente submersa e a popa levantada ao alto, com as hélices expostas, a estrutura do navio não suportou as tensões, colapsando e se partindo ao meio. A proa afundou em um ângulo bastante pronunciado, resultando em uma grande força durante o seu impacto. A popa, sem a frente principal hidrodinâmica da proa, afundou em um movimento em espiral havendo a explosão e ejeção de compartimentos e peças.

Ilustração do momento em que o RMS Titanic se rompe. Fonte: Inspeção de Equipamentos, 2013

Ao longo dos anos, inúmeras hipóteses tentaram explicar as possíveis causas do acidente, mas duas receberam maior destaque: A primeira  acreditava que a falha encontrava-se nas chapas do casco; a segunda hipótese acreditava que a falha ocorreu pelos rebites que uniam as placas. 

Hipóteses da falha estrutural no casco do RMS Titanic. Fonte: Inspeção de Equipamentos, 2013

Para a primeira hipótese, foi sugerido que a falha se deu pela fragilização da estrutura do RMS Titanic. As águas do Atlântico Norte no dia do naufrágio atingiram temperaturas de -2°C.  Testes investigativos realizados anos após, indicaram que o material empregado nas chapas do casco apresentou uma temperatura crítica (transição dúctil-frágil) em torno de 32°C, um valor muito acima da temperatura do meio em que o material foi exposto. A composição química do aço carbono empregado possuia elevados teores de enxofre, oxigênio e fósforo, além de elementos fragilizantes e baixo teor de manganês, que contribuiria para a ductilidade do material. 

Ensaios de impacto realizados na década de 90, indicaram que o aço utilizado no Titanic era dez vezes mais frágil do que os aços de fabricação moderna para as mesmas condições do acidente. Entretanto, com testes mais modernos e que se aproximavam das condições do impacto do navio, essa hipótese foi descartada após comprovarem que o aço das chapas, a temperaturas próximas de 0°C, apresentavam tenacidade suficiente para dobrar em caso de impacto, ao invés de fraturar.

Para a segunda hipótese, estudos metalúrgicos foram realizados para avaliar a composição química dos rebites. Com base nos históricos do local no qual foi construído o navio ( Belfast, Irlanda do Norte) e nos conhecimentos modernos, percebeu-se que os rebites utilizados não apresentavam uniformidade em sua constituição e não foram distribuídos corretamente ao longo da estrutura, havendo espaçamentos irregulares entre as linhas. Durante a investigação realizada pelos norte americano, foi descoberto que os rebites feitos de ferro das parte dianteira e traseira do navio (proa e popa) possuíam uma menor qualidade quando comparado aos utilizados na região central do casco, feitos de aço baixo carbono.

Rebites distribuídos ao longo da extensão do caso do RMS Titanic. Fonte: Inspeção de Equipamentos, 2013

Isso se deve a alta concentração de escória presente na composição química dos rebites de ferro, justificando o seu baixo custo na época. Por ser um rejeito, a escória pode apresentar propriedades mecânicas diferentes do resto da estrutura do material, conferindo maior fragilidade em condições de tensões aplicadas, como foi o caso do impacto com o iceberg. 

Representação das regiões com rebites de aço baixo carbono (região central do caso) e com rebites de ferro forjado (proa e popa). Fonte: Inspeção de Equipamentos, 2013

Outro aspecto analisado foi que a complexidade das curvas do chapeamento, como nas regiões dos extremos do RMS Titanic, sendo preciso que os rebites fossem inseridos manualmente por operários, ao invés do uso de prensas hidráulicas, comumente utilizadas para inserção. Resultados de ensaios apontaram que a presença de pressões externas nas cabeças dos rebites resultou na quebra e descolamento das placas, ao se aproximar do seu limite de resistência .

Sabe-se que o naufrágio do RMS Titanic foi o efeito de um conjunto de falhas secundárias e de decisões, gerando danos irreversíveis e catástrofes. Problemas estruturais como fragilização a frio das placas metálicas, baixa qualidade e distribuição irregular dos rebites indicam um projeto deficiente do navio.  Embora fosse um grande marco, os principais fornecedores das peças não conseguiram atender a demanda, sendo necessário recorrer a fabricantes pequenos. Sem tanto investimento, as peças foram feitas manualmente, não havendo uma padronização ou uniformidade, acarretando em instabilidade e baixa qualidade dos produtos.  

Assim, conclui-se que o naufrágio do RMS Titanic foi devido um evento em cascata de falhas: baixa qualidade dos materiais utilizados; união das chapas por rebites de forma manual; inexperiência dos fornecedores dos rebites; despreparo da tripulação do navio; decisões errôneas do capitão e cortes no orçamento por parte da White Star Line.     

 

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Por:André Costa e Gabrielle Souza

 

Referências Bibliográficas

 

CASO 037: fragilização à frio? – titanic (1912). Inspeção de Equipamentos: estudo de casos, 2013. Disponível em: http://inspecaoequipto.blogspot.com/2013/09/caso-037-fragilizacao-frio-titanic-1912.html. Acesso em 25 nov. de 2021.

 

CAZARIM, Larissa. Falhas estruturais em embarcações mercantes. 2015. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharel em Ciências Náuticas) – Curso de Formação de Oficiais de Náutica/Máquinas da Marinha Mercante, Centro de Instrução Almirante Graça Aranha. Rio de Janeiro, p.68. 2015. Disponível em: \http://www.redebim.dphdm.mar.mil.br/vinculos/00000b/00000bf9.pdf. Acesso em 25 nov. de 2021.

 

MARCOMINI, José; BAPTISTA, C. Análise de falhas. ABM Metalurgia, Materiais e Mineração. 2015. v. 71. pp.73-76. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/272867028_Analise_de_falhas.Acesso em 25 nov. de 2021.

 

MARTENDAL, Caroline. A verdade por trás do naufrágio do titanic. Engenheiro de Materiais, 2017. Disponível em: https://engenheirodemateriais.com.br/2017/05/24/a-verdade-por-tras-do-naufragio-do-titanic/. Acesso em 25 nov. de 2021.

STAFF, National Georgaphic. Como foi o naufrágio e a redescoberta do titanic. National Geographic, 2019. Disponível em: https://www.nationalgeographicbrasil.com/historia/2019/08/como-foi-o-naufragio-e-redescoberta-do-titanic. Acesso em 25 nov. de 2021.

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